A tragédia causada pelas chuvas no Rio Grande do Sul trouxe uma situação de calamidade para o povo daquele estado.
Para quem, como eu, que está longe geograficamente da tragédia, devemos nos solidarizar com quem sofre, orando e ajudando como pudermos.
Além desta tragédia nacional, a minha igreja passa por um luto neste momento que eu escrevo. Ontem perdemos um jovem querido, de uma família querida. Após anos lutando com vários problemas de saúde, o Nosso Senhor decidiu levá-lo para casa.
Sei que Deus está no controle, mesmo quando os acontecimentos partem o nosso coração. Ser cristão não nos exime de experimentar sofrimento e dor por estes acontecimentos. É tudo parte da experiência humana num mundo caído, pela qual até Jesus Cristo passou.
A força da empatia
Não importa a distância ou proximidade da dor, o quanto ela nos afeta pessoalmente, a Bíblia nos ensina como lidar com momentos assim:
Alegrem-se com os que se alegram e chorem com os que choram. (Romanos 12:15 NVI, ênfase minha)
O apóstolo Paulo nos ensina a ter empatia, a nos colocar no lugar da outra pessoa, e compartilhar sua alegria ou tristeza.
Nestes casos que citei, ele nos desafia a nos colocar ali, no meio das enchentes, imaginando como seria passar pelo que nossos compatriotas e irmãos estão passando; imaginar não ter comida ou água, as mínimas condições para sobreviver; ver seus filhos e pessoas amadas desesperadas, em risco iminente; ver tudo o que você trabalhou anos para obter destruído pelas águas; ver pessoas amadas sem vida…
Ou ainda, no caso mais próximo a mim, imaginar a dor de uma mãe em ver seu filho querido que lutava para viver, ter sua história finalizada; imaginar as horas de oração e lágrimas culminar com a partida do seu primogênito.
A empatia nos convida a nos colocar no lugar da pessoa que tem que ouvir um “não” de Deus, talvez naquele que seja o momento mais crítico de sua vida.
Fazendo isso, tendo verdadeira compaixão de quem sofre, é impossível que os nossos olhos permaneçam secos, e que o nosso coração não se parta e chore com os que choram.
Para estes momentos, a Bíblia também nos fornece a maneira de expressar sentimentos aparentemente paradoxais: de continuar confiando em Deus, tendo que lidar com Seu aparente silêncio ou com sua decisão de negar o que pedimos, juntamente com toda a tristeza e o sofrimento que fazem o coração partir.
Esta maneira é o lamento.
Lamento: a maneira bíblica de expressar a tristeza
Confie nele em todos os momentos, ó povo; derrame diante dele o coração, pois Deus é o nosso refúgio. (Salmo 62:8 NVI)
Existe uma diferença crucial entre lamento e reclamação ou murmuração.
No lamento, aquele que sofre leva seu sofrimento a Deus. A pessoa entrega tudo ao Senhor, ainda que esperar nEle (no sentido de ter esperança) seja muito difícil.
Por outro lado, a reclamação ou murmuração mostra que não aprovamos o jeito com o qual Deus está fazendo as coisas e, em geral, que nós faríamos melhor (ainda que isso seja inconsciente). Isso desagrada profundamente a Deus (1 Coríntios 10:10; Filipenses 2:14), e projeta o desejo de sermos deuses da nossa própria vida.
O lamento é bíblico, é uma expressão sincera da nossa dor, até mesmo da nossa tristeza pela falta de resposta de Deus. Mas inclui também o reconhecimento de que Ele é o único que pode trazer consolo e até mesmo uma saída daquela situação.
O lamento, na prática
Deus se revelou a nós por meio de palavras, e nos deu palavras para verbalizar aquilo que está em nossa mente e em nosso coração.
Por isso, usarei palavras para fazer uma oração de lamento, expressando a profunda tristeza por estes acontecimentos.
No entanto, nessa oração eu não usarei as minhas palavras. Como aprendi com o pastor John Piper, eu usarei palavras da própria Bíblia.
Neste momento, eu prefiro confiar nas Escrituras e tomar emprestadas as palavras de dor e tristeza de profetas e homens de Deus que, inspirados pelo Espírito Santo, nos ensinam a lamentar. Usarei palavras do próprio Senhor Jesus também.
Mas não vou orar como expectadora. Orarei com empatia, como a Bíblia nos ensina. O sofrimento do outro é meu sofrimento.
Vou chorar com os que choram.
Se desejar, ore comigo…
Uma oração bíblica de lamento
(Veja a lista com as referências dos versículos desta oração ao final do artigo)
Até quando, Senhor, clamarei por socorro, sem que tu ouças?
Até quando, Senhor? Para sempre te esquecerás de mim? Até quando esconderás de mim o teu rosto?
Ó Deus, tu és o meu Deus, eu te busco intensamente; a minha alma tem sede de ti!
A minha alma está profundamente triste, numa tristeza mortal.
Cansei-me de pedir socorro; minha garganta se abrasa. Meus olhos fraquejam de tanto esperar pelo meu Deus.
Ouve o meu clamor, ó Deus; atenta para a minha oração. Desde os confins da terra eu clamo a ti, com o coração abatido; põe-me a salvo na rocha mais alta do que eu.
Minhas vistas já estão fracas de tristeza. A ti, Senhor, clamo cada dia; a ti ergo as minhas mãos.
As minhas lágrimas têm sido o meu alimento dia e noite, pois me perguntam o tempo todo: “Onde está o seu Deus?”.
Estou exausto de tanto gemer. Ao longo da noite inundo a cama com o meu pranto; de lágrimas encharco o meu leito.
Sinto-me muito fraco e totalmente esmagado; meu coração geme de angústia.
Não me permites fechar os olhos; tão inquieto estou que não consigo falar.
Tenho sofrido tanto que a minha vida está à beira da sepultura!
Salva‑me, ó Deus, pois as águas subiram até o meu pescoço! Nas profundezas lamacentas eu me afundo; não tenho onde firmar os pés. Entrei em águas profundas; as correntezas me arrastam. Cansei‑me de pedir socorro; a minha garganta se abrasa. Os meus olhos fraquejam de tanto esperar pelo meu Deus.
Meus olhos estão cansados de chorar, a minha alma está atormentada, o meu coração se derrama, porque o meu povo está destruído, porque crianças e bebês desmaiam pelas ruas da cidade. Eles clamam às suas mães: “Onde estão o pão e o vinho?” Ao mesmo tempo em que desmaiam pelas ruas da cidade, como os feridos, e suas vidas se desvanecem nos braços de suas mães.
Como a relva ressequida está o meu coração; esqueço até de comer!
Lembro-me da minha aflição e do meu delírio, da minha amargura e do meu pesar. Lembro-me bem disso tudo, e a minha alma desfalece dentro de mim. Todavia, lembro-me também do que pode me dar esperança: Graças ao grande amor do Senhor é que não somos consumidos, pois as suas misericórdias são inesgotáveis. Renovam-se cada manhã; grande é a sua fidelidade! Digo a mim mesmo: A minha porção é o Senhor; portanto, nele porei a minha esperança.
Embora ele traga tristeza, mostrará compaixão, tão grande é o seu amor infalível.
Mas eu, Senhor, a ti clamo por socorro; já de manhã a minha oração chega à tua presença.
Eu, porém, confio em teu amor; o meu coração exulta em tua salvação.
Mesmo não florescendo a figueira, e não havendo uvas nas videiras, mesmo falhando a safra de azeitonas, não havendo produção de alimento nas lavouras, nem ovelhas no curral nem bois nos estábulos, ainda assim eu exultarei no Senhor e me alegrarei no Deus da minha salvação.
Amém.
Versículos bíblicos que usei na oração (cada parágrafo corresponde a um destes trechos, em ordem): Habacuque 1:2; Salmo 13:1; Salmo 63:1; Mateus 26:38; Salmo 69:3; Salmo 61:1-2; Salmo 88:9; Salmo 42:3; Salmo 6:6; Salmo 38:8; Salmo 77:4; Salmo 88:3; Salmo 69:1-3; Lamentações 2:11-12; Salmo 102:4; Lamentações 3:19-24; Lamentações 3:32; Salmo 88:13; Salmo 13:5; Habacuque 3:17-18. Clique aqui para acessar todos os versículos numa única página no BibleGateway.
Glória a Deus, muito profundo. Que o Senhor conforte nossos corações e nos dê forças para seguirmos firmes 🙏🏽